Que BTS é um fenômeno mundial a gente já sabe, mas ser notícia no New York Times e ainda por cima se referindo a América Latina pode ser novidade. O texto a seguir foi traduzido e adaptado do artigo do colunista da Billboard, Jeff Benjamin, para o NY Times, em que ele explana o sucesso que o grupo fez na sua passagem pelo Chile. O mesmo panorama pode ser visto relacionado com percurso do grupo pelo Brasil.
A mania musical da Coreia do Sul varreu a maior parte do mundo em uma tempestade, mas o Chile representa uma conquista improvável.
Se você estivesse assistindo a TV chilena em certa manhã de uma sexta-feira do mês passado, você teria encontrado uma cena surpreendente: a interrupção de um noticiário em nome do pop coreano.
A repórter da Chilevisión estava dentro do Aeroporto Internacional de Santiago, tentando o seu melhor para obter um vislumbre do BTS – uma abreviação para o termo coreano Bangtan Sonyeondan, ou “bulletproof boy scouts” em inglês – uma das bandas de k-pop mais famosas dos últimos anos, com concertos esgotados nas datas 11 e 12 de março no Movistar Arena, assim como todas as outras datas de sua turnê. Ela não conseguiu um comentário do grupo, mas seu cameraman conseguiu um bom take deles enquanto sua enorme comitiva passava com hordas de fãs gritando e carregando cartazes. Ela também encontrou uma jovem com sorriso reluzente que parecia estar à beira das lágrimas. “Valeu a pena esperar?”, perguntou a repórter. “Valeu”, a menina respondeu com voz rouca e feliz. “Esperei a noite inteira.”
O K-pop tomou a maioria do mundo em sua tempestade, mas o Chile representa uma conquista recente e um tanto improvável. Nenhuma das estações de rádio tradicionais mostravam qualquer interesse em tocar k-pop. Até agora, as importações musicais da nação tenderam a influências latinas – como reggaeton e hip-hop – ou pop americano. Então, há as impressões ecléticas caseiras como Mon Laferte (conhecida por seu mix experimental de blues e rock eletrônico), Camila Moreno (uma cantora e compositora de pop alternativo) e Gepe (uma cantora folclórica chilena de New Age que mistura, entre outras influências, música dos anos 60 e 70 dos Andes com pop eletrônico).
Então BTS e seus pares foram forçados a esgueirar-se através da internet. Um importante ponto de entrada foi a Coca-Cola FM, a gigante plataforma de rádio on-line do refrigerante, que é amplamente desconhecida para o público americano e popular no Chile, com uma audiência diária estimada em 40 mil pessoas. Toda sexta-feira, a rede gere um programa de K-pop apresentado pelo DJ chileno Rodrigo Gallina. A mídia social também tem desempenhado um papel tremendo: o BTS tem mais de cinco milhões de seguidores no Twitter e, até à data deste artigo, o BTS passou 22 semanas na 1ª posição no chart Billboard’s Social 50, que classifica a atividade global on-line das fanpages ativas dos artistas e músicas semanais. Uma conta do twitter dedicada ao BTS Chile, dirigida por três fãs, publica regularmente traduções em espanhol de artigos e notícias sobre a banda e os próprios posts da banda em mídias sociais. Alguns fãs chilenos se sintonizam diretamente com o popular aplicativo Vapp da Coreia, onde os artistas fazem transmissões ao vivo e que fãs de qualquer lugar do mundo podem participar e fazer perguntas (o canal do BTS tem mais de 4,7 milhões de seguidores).
A popularidade online da banda se tornou tão sólida no Chile que os promotores de turnê nem sequer se preocuparam com um impulso na mídia tradicional. Os fãs aguardaram fora da bilheteria da arena para comprar ingressos, que variou de 38 a 212 dólares, por até uma semana de antecedência. Todos os 12.500 ingressos para o que era suposto ser apenas um show, esgotaram em um recorde de duas horas. “A velocidade dessas vendas nos fez começar imediatamente os preparativos para um segundo show“, diz Gonzalo Garcia, o CEO e fundador da NoiX Productions, que se concentra estritamente em trazer artistas asiáticos para o Chile e outros países da América Latina. Eventualmente, a NoiX publicou oito dias de anúncios impressos no jornal diário La Tercera, simplesmente como um agradecimento aos fãs que compraram ingressos.
Backstreet Boys, One Direction e Jonas Brothers tocaram no Chile, mas as boybands coreanas são um fenómeno recente, tendo começado a visitar o país apenas a partir de 2012. Antes do seu desempenho no mês passado, a BTS fez um show no Chile em sua última turnê em agosto de 2015, mas os promotores reservaram apenas metade do Movistar Arena. Nos meses que se seguiram, porém, a popularidade do grupo subiu rapidamente no mundo do K-pop – o álbum “Wings” foi o álbum mais vendido da Coreia do Sul em 2016 – com fãs em todo o mundo aparentando se conectar com o som cada vez mais refinado e mensagens esperançosas. “Falamos sobre nossa própria confusão e desordem mental o mais honestamente possível na música e [como] cresce conosco à medida que envelhecemos“, diz o líder da banda, Rap Monster. “Acreditamos que os fãs chilenos tendem a se conectar a esses valores.“, acrescentou.
Os gerentes deslumbrados da banda lutam para encontrar métricas adequadas para capturar a extensão da BTS Mania no Chile. Há dinheiro, é claro; Garcia diz que a venda de ingressos da série de concertos de dois dias deste ano “ultrapassou a marca de 2 milhões de dólares”, e esse número nem sequer inclui a receita da enorme quantidade de mercadoria do BTS (como um light stick de 45 dólares ou um ventilador de mão com os rostos dos membros impressos nele por 9 dólares) vendidos na arena. Para a gravadora sul-coreana do BTS, a Big Hit Entertainment, o mais notável é o engajamento on-line, que parece monitorado muito de perto. “Nós cruzamos as estatísticas dos canais de mídias sociais para confirmar o nível de lealdade da fanbase no país”, diz Yandi Park, um gerente de negócios da Big Hit. “Nós esperávamos ter boas vendas de ingressos, porque os promotores também estavam confiantes… mas não esperavam a lotação em minutos”. Depois, há as expressões orgânicas de fervor de fãs: em parques e locais públicos em todo o Chile, milhares de fãs começaram a se reunir com frequência para aprenderem juntos danças de K-pop.
Talvez a métrica mais impressionante, porém, também a mais alarmante, seja dos proprietários do Movistar Arena que disseram a Garcia que o público gritava sozinho durante os shows do BTS deste ano – ou seja, nos momentos em que a banda não estava sequer atuando – e atingiu o volume de 127 decibéis, bem além do nível de ruído em que a perda auditiva permanente se torna uma séria preocupação. O promotor relata orgulhoso como o mais alto já gravado na arena. “O público grita sozinho”, Garcia repete, uma nota de temor rastejando em sua voz. “Foi uma loucura.”
Tradução por Amanda Carolina
Artigo original: NY Times
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