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Duas fotos de IU e Lee Hyun Woo. Os dois estão sentados e encostando a cabeça. IU passa seu braço em volta do pescoço de Lee Hyun Woo. A versão à esquerda mostra a imagem original. A versão à direita mostra uma edição com os artistas com olhos azuis e a pele bem mais clara.
Sociedade

Whitewashing e os extremos do padrão de beleza coreano

A grande fama da Coreia do Sul como país líder em produtos de beleza já se espalhou pelo mundo. Porém, junto aos cosméticos, o mundo também conheceu a obsessão dos coreanos por padrões de beleza. A busca por um rosto “perfeito” faz com que muitos se submetam às cirurgias plásticas e tratamentos estéticos extremos. Um desses padrões é manter uma pele branquíssima.



A expressão usada para este fenômeno é “whitewashing”, ou branqueamento em português. Talvez você já tenha visto o termo sendo usado no contexto cinematográfico para se referir ao ato de escalar atores brancos para atuarem como personagens latinos, asiáticos ou de outras raças.

No contexto coreano, a palavra ganha um contorno mais literal de embraquecer algo. Às vezes, a níveis exagerados. Para quem acompanha o k-pop, por exemplo, é comum ver fanbases postando fotos retocadas de idols para fazer com que pareçam mais pálidos do que realmente são.

Para entender melhor esta questão, vamos conhecer o motivo que levou a sociedade a buscar tão obsessivamente uma pele branca, a começar pelo que originou tal padrão.


As origens do padrão de beleza

Créditos: The Vou (reprodução)

As peles com tons muito claros já eram consideradas um padrão de respeito desde as origens do xãmanismo coreano. Na história que deu origem à religião, o primeiro humano nasceu com a pele branquíssima, para simbolizar sua pureza. Já no período da Dinastia Koryo, que esteve no poder de 918 a 1392, crianças de classes superiores lavavam seus rostos com água de flores de pêssego para deixar suas peles limpas e claras. Já as jovens se esforçavam para deixar suas peles o mais branco possível antes do casamento.

Conforme o país foi sendo tomado pela agricultura, a Coreia passou a associar tons de pele às classes sociais. Pessoas com pele escura eram associadas às classes baixas, aqueles que passavam o dia todo trabalhando sob o sol nas lavouras ou em outros trabalhos que exigiam mais esforço físico.

Por outro lado, a aristocracia, que passava boa parte do dia em seus palácios, mantinha a pele mais branca. Portanto, tons mais claros eram associados aos nobres e trabalhadores de alto escalão.

Em 1867, quando o país abriu suas fronteiras para países estrangeiros, produtos de beleza importados – como maquiagens, roupas e acessórios – passaram a ser disponibilizados para a população local. Assim, a Coreia passou a adotar os padrões de beleza ocidental. No início do século 20, a atriz Marlene Dietrich era um dos sinônimos de beleza no país.

A atriz Marlene Dietrich
Créditos: reprodução


Uso de cosméticos para branqueamento

Conforme o país foi crescendo no mercado de cosméticos, eles também passaram a fazer parte do processo de branqueamento. Porém, antes de tentar branquear a pele, o melhor é evitar o contato com o sol. Por isso, as primeiras barreiras de proteção para a pele são físicas. Não é difícil ver coreanos andando com blusas de manga longa, chapéus ou até guarda-chuvas para se protegerem do sol.

Para proteção extra, os cosméticos estão aí. Um dos produtos mais básicos para a rotina de cuidados com a pele é o protetor solar. Na Coreia, ele é item obrigatório para, também, ajudar a manter os tons claros. Além dele, também existem linhas de maquiagem com substâncias protetoras para deixar a pele ainda mais protegida contra os raios ultravioletas.

Porém, também existem cremes com efeito clareador, alguns deles podem até trazer efeitos nocivos para a saúde. O vídeo abaixo do Doutor Anthony Youn – cirurgião plástico que ficou famoso ao fazer vídeos no TikTok – mostra um exemplo de produto usado para branquear a pele.

A substância citada pelo Dr. Youn que provavelmente faz parte da composição do creme é a hidroquinona. Produtos com hidroquinona são indicados em tratamento de hiperpigmentação na pele. Seus usos mais comuns são para tratar manchas causadas por acne ou pela idade, sardas, melasmas e marcas causadas por inflamações, como psoríase e eczema.

Em geral, a hidroquinona não possui muitos efeitos colaterais. Em poucos casos pode causar alergias, que somem ao longo do tempo, e, em raríssimas ocasiões, os pacientes podem apresentar ochronosis endógeno, doença caracterizada por manchas azuladas ou escurecidas.

A outra substância mencionada, porém, pode ter efeitos mais graves. A glutationa é um antioxidante usado para combater os radicais livres do corpo. Não existe nenhum estudo científico que comprove que tenha algum efeito clareador de pele, mas o remédio é amplamente usado em países asiáticos e até mesmo nos Estados Unidos com esse propósito. Neste caso específico, a glutationa é aplicada em injeções e, de acordo com a Dra. Seemal Desai, os pacientes podem até sentir que a pele está mais clara após o uso da substância. Porém, a longo prazo, a substância pode causar alergias na pele e problemas na tireóide e nos rins. Tais efeitos fizeram com que o governo filipino banisse o uso de glutationa nos spas pelo país.

A variedade de produtos de embranquecimento vai de loções a cremes que podem ser aplicados em todo o corpo. O padrão de peles brancas é reforçado, também, pelas propagandas de tais produtos. Marcas como Estee Lauder e L’Oreal majoritariamente usam modelos brancos em seus comerciais. E elas não estão sozinhas, visto que estimativas apontam que apenas 44% das propagandas no país usam modelos caucasianos. No Japão, a porcentagem chega à 54%.


Whitewashing pelas fanbases

O exemplo mais comum de casos de whitewashing presenciados pelos fãs são os conteúdos de fanbases. Os chamados “masters”, que comandam as fanbases, procuram comparecer ao máximo de eventos possíveis para fotografar os artistas e, posteriormente, divulgar o material exclusivo em suas redes. Porém, o material final sempre passa por edições via Photoshop ou outros programas similares, às vezes dando aparência fantasmagórica aos artistas.

Sem olhar a versão original da foto à esquerda, você diria que esta é a Tiffany do Girls’ Generation? A versão à direita foi trabalho do Tumblr Blue Eyed K-pop Idols que, além de clarear a pele da cantora, ainda editou seus traços para lhe dar lábios mais cheios, entre outras coisas.

Créditos: SM Entertainent e Blue Eyed K-pop Idols

O responsável pela edição acima teve mais trabalho que o normal, mas um considerável número de fanbases fazem o trabalho de ajustar o brilho das imagens para fazer com que os idols pareçam mais pálidos. Alguns dos idols que são constantemente alvos de edições são justamente aqueles que possuem a pele mais escura, como Kai (EXO) e Cha Hakyeon (VIXX).

Versão à esquerda editada pelo Tumblr deliciae e versão à direita da fanbase Only for VIXX N.
Créditos: deliciae e Only fox VIXX N.

O uso de edições em si já pode soar absurdo, principalmente para fãs estrangeiros, mas ao mesmo tempo há constantes comentários depreciativos sobre os idols. Um exemplo pode ser visto abaixo com esta foto do grupo SISTAR:

Créditos: Tumblr (reprodução)

Comentário de um netizen:

[+115, -5] Frango assado, frango apimentado, frango com shoyu, rabanete em conserva velho

Não é difícil encontrar relatos sobre comentários do mesmo nível feitos por idols sobre outro idols com tons de pele mais escuros. Porém, vira e mexe vemos manifestações de orgulho por parte de alguns deles. Um desses casos, foi este comentário feito por Kai em um evento ao qual compareceu com o EXO.


O embate entre fãs

Créditos: Instagram NCTMeme via Pinterest (reprodução)

O debate entre fãs coreanos e estrangeiros sobre o uso de edições em fotos não é algo de hoje e parece estar longe de terminar. Um movimento de fãs se empenha em tirar os efeitos de branqueamento das fotos da fanbases e acabou gerando indignação dos fãs coreanos.

Alguns argumentam que as fotos reeditadas acabam escurecendo o tom de pele dos idols além do que realmente são. Outro ponto é que algumas das fotos usadas como exemplo de representação do tons reais são com iluminação amarelada, o que pode fazer com que as edições baguncem as cores reais.

Por último, netizens coreanos argumentam que é discriminatório e racista tirar os efeitos das fotos baseado apenas na opinião dos estrangeiros sobre os verdadeiros tons de pele dos próprios coreanos. Um deles digitou: “Coreanos são brancos. É preconceituoso e racista dizer que asiáticos do norte são amarelos e com pele escura. Essas pessoas são ignorantes“.

Por outro lado, fãs estrangeiros continuam espalhando a mensagem de aceitação dos mais variados tons de pele. Alguns Tumblrs, como o Melaninup, e perfis no Twitter buscam arrumar as edições exageradas das fanbases para que mais pessoas possam ver os idols em suas versões mais verdadeiras. Nas palavras de um outro netizen estrangeiro: “Não me diga que você gosta do BTS que parecem fantasmas em algumas fotos mais do que o BTS com seus tons de pele naturais. Digo, eles são tão bonitos e a cor da pele deles os tornam mais bonitos. Após ver essas fotos, decidi salvar e postar apenas fotos não branqueadas sempre que possível“.

Apesar das polêmicas levantadas pela questão, a lição que fica é a dita pelo Dr. Youn no vídeo anexado aqui: “Precisamos nos livrar dessa ideia de que quanto mais branca, mais bonita a pele é. Isso não é verdade“.

Fontes: (1), (2), (3), (4), (5), (6)
Imagens: Unionbay, Blue Eyed K-pop Idols, The Vou, SM Entertainment, deliciae (Tumblr), Only fox VIXX N, Tumblr, Pinterest
Não retirar sem os devidos créditos.

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  • Greyce Oliveira

    Cearense de Fortaleza, é metade uma humana normal professora de Inglês e metade ELF(a) precisando (talvez) de tratamento para parar de falar no Super Junior toda hora.

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