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Saiba como é feito o makgeolli, o destilado milenar sul-coreano

As pessoas mais entrosadas com a cultura sul-coreana já sabem que sair para beber na Coreia do Sul é algo tão ou até mais comum do que aqui no Brasil. Vemos nos K-dramas cenas clássicas do “happy hour” pós-trabalho, muitas vezes com cervejas e soju, mas além dessas, existe um outro destilado bem famoso no país, o makgeolli.



Makgeolli (막걸리) é um vinho feito de arroz, com aparência leitosa e com gosto mais doce. Seu teor alcoólico não é muito alto quando comparado ao do soju, possuindo apenas uma taxa de álcool entre 6,5% e 7%. O nome vem da combinação das palavras coreanas mak (que significa “quase pronto” ou “um momento atrás”) e geolleun (“filtrado”). Foi apelidado de “Drunken Rice” pelos britânicos e o vinho também já foi chamado de “Fight Milk”, pela banda escocesa Colonel Mustard & The Dijon 5 em 2018.

Créditos: trazy (reprodução)

O vinho de arroz é muito tradicional e popular dentro e fora da Coreia. Venha conhecer um pouco mais sobre este destilado milenar. 


História do makgeolli

O álcool mais antigo da Coreia existe há mais de 2000 anos. Alguns dizem que existia na época dos Três Reinos (57 A.C.-668 D.C.), mas a primeira menção de um destilado que lembra o makgeolli foi encontrada no 제왕운기 (jewangungi), traduzido como “Canção dos Imperadores e Reis”. Trata-se de um livro histórico composto por dois volumes sobre a história coreana e chinesa publicado em 1287, ou seja, nos tempos da Dinastia Goryeo (918-1392). Na época, a bebida era conhecida como Ihwaju (álcool de flor de pereira), pois a bebida era produzida na mesma época em que as pereiras floresciam. 

Além de Ihwaju, o vinho de arroz também era conhecido como Nonju (álcool do fazendeiro), já que era a bebida favorita dos fazendeiros, camponeses e toda a classe trabalhadora – o que, com o tempo, acabou simbolizando que o makgeolli não era um drinque de muita classe. Uma das razões para a popularidade do destilado era a sua simplicidade. Como é uma receita sem muitos desafios, muitas famílias coreanas ainda possuem a sua própria receita. 

Com a dominação japonesa sobre a península coreana no início do século XX, muitas indústrias caseiras acabaram finalizando as suas produções, pois o governo colonial implementou a “Lei do Imposto sobre Licor” em 1909, que exigia que toda produção alcoólica fosse tributada e licenças eram exigidas até para o autoconsumo.

Em 1934, a fabricação caseira do makgeolli foi completamente proibida, sendo permitida apenas a produção em fábricas regulamentadas e com tributação, o que tornou o destilado uma fonte de receita para o império em expansão. 

As batalhas militares constantes, como a Segunda Guerra Mundial e a Guerra das Coreias, deixaram o país totalmente devastado e escasso de comida. O governo continuava com a fiscalização rígida na produção de destilados, mas na década de 1960, na ditadura de Park Chung Hee, a situação piorou e o uso do arroz para a preparação do vinho foi totalmente proibido sob a “Lei de Gerenciamento de Grãos”.

A situação complicada do país não impedia que a população procurasse por álcool. As companhias de soju procuraram métodos diferentes para encontrar amido, como batata-doce e tapioca, enquanto os fabricantes de makgeolli usavam o trigo americano. Segundo o especialista Jisung Chun, os Estados Unidos tinham um excesso de trigo apodrecendo em seus armazéns. A prática continuou até os dias atuais, os makgeollis mais baratos ainda são feitos a partir do trigo ao invés do arroz, mas por conta da troca de ingrediente, a popularidade da bebida acabou caindo. 



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Apesar da proibição das produções caseiras, muitas mulheres ainda fermentavam o álcool em segredo. Lavar, cozinhar e preparar o arroz até o resultado final era trabalho das mulheres antes da colonização. Isso porque precisava de fermentação como outros alimentos, como kimchi, pastas e molhos de soja. Muitas mulheres tomaram a decisão de fabricar e até vender makgeolli clandestinamente para adquirir uma renda extra e conseguir alimentar sua família de uma forma mais confortável.

No início dos anos 1990, conforme a economia nacional foi melhorando, a proibição de álcool de arroz foi suspensa, mas a produção caseira só voltou a ser legalizada em 1995. No decorrência da história, muitas tradições do makgeolli foram perdidas, apesar da produção nunca ter parado completamente. 

Pesquisadores como Park Rockdam viajaram todos os cantos da Coreia coletando receitas e aprendendo técnicas milenares de como o vinho era preparado antigamente para tentar recuperar a “arte perdida”. O governo também acabou mudando muito sua visão sobre a bebida, vendo-a agora como uma bela herança de seus tempos passados, além de uma indústria lucrativa.

Essa mudança de visão do governo foi essencial para algumas mudanças que não só ajudaram, mas também fizeram com que aumentasse o número de produtores. De acordo com dados do Serviço Nacional de Impostos (NSO), desde 2009, o número de licenciados para a fabricação do makgeolli aumentou 43%. Em 2016, foi reduzido o requisito de tamanho do tanque de fermentação de 5 mil para mil litros, o que ajudou muito cervejarias e destilarias de pequena escala. No ano seguinte, foi permitido que as bebidas tradicionais fossem vendidas on-line, o que possibilitou que a produção continuasse nos tempos pandêmicos. 

Enquanto a pandemia de COVID-19 impedia que a população fosse a bares e restaurantes, as vendas on- e off-line do makgeolli dispararam. Segundo um relatório de 2021 da Korea Agro-fisheries and Food Trade Corporation, o mercado do makgeolli cresceu 52,1%, enquanto o mercado total de bebidas alcoólicas diminuiu 1,6% em 2020.


Como o makgeolli é feito?

Apesar de ser uma receita teoricamente simples, com somente 3 ingredientes (arroz, água e nuruk – uma espécie de fermento), existem várias técnicas para fazer o makgeolli perfeito, como a temperatura, o tipo de arroz e de água usados, como armazenar a solução perfeitamente, etc.

Créditos: kimchimari (JinJoo) (reprodução)

Basicamente, ao adicionar o nuruk ao arroz doce cozido e água, a mistura é deixada por cerca de uma semana e o fermento age para quebrar o amido do arroz em açúcar e depois em álcool, produzindo uma mistura doce forte, com o teor alcoólico maior do que o industrializado, chamada wonju. O wonju é deixado assentar e o líquido transparente superior é separado. O álcool resultante é o cheonju e o restante, conhecido como takju, é diluído com água e coado grosseiramente para fazer makgeolli.


Como beber o makgeolli?

Makgeolli geralmente não são servidos em copos pequenos de vidro como soju, mas sim em pequenas tigelas de metal ou em copos arredondados feitos de uma variedade de materiais. É extremamente versátil, ou seja, pode ser servido em um bar como uma bebida diária ou em ocasiões especiais, como casamentos.

Independente do lugar em que for tomar, o melhor é que o líquido esteja frio. Se estiver bebendo a versão industrializada, lembre-se de que haverá sedimentos que precisam ser sacudidos, mas o líquido também é efervescente. Então dê uma sacudida bem suave, deixe por um minuto, e abra a tampa lentamente. 

Fonte: (1), (2), (3), (4), (5), (6), (7)
Imagens: trazy, JinJoo, Liverice – reprodução
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  • Gabriela Oliveira

    Jornalista de 25 anos com um pé na hallyu e o outro na escuridão.

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