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Poesia sul-coreana: o grito político de uma sociedade indignada

Desde criança somos inseridos no meio da poesia, é praticamente impossível ignorar esse gênero literário, pois está presente em canções, cantigas, brincadeiras, preces, dentro da sala de aula – em inúmeras situações – e muito mais. O gênero é considerado um dos precursores da literatura, afinal, estudos acreditam que o primeiro poema surgiu na Mesopotâmia por volta de 2100 a.C!

Neste dia 21 de março é comemorado o Dia Mundial da Poesia. A data foi criada na 30ª Conferência Geral da UNESCO, em 16 de novembro de 1999, com a intenção de comemorar a diversidade dos poemas e diálogo, a livre criação de ideias através das palavras, a criatividade e a inovação.

Em homenagem a essa data e para apresentar um novo universo a todos vocês, a KoreaIN separou notáveis autores e obras da poesia sul-coreana. Por isso pegue sua wishlist e anote os títulos que pesquisamos e selecionamos com muito carinho.



A Poesia Coreana

A poesia moderna coreana começou no final do século 19, onde a forma de se expressar ainda estava ligada nos ideogramas chineses. Com a disseminação do hangul, e o movimento modernista se aproximando, as obras passaram a refletir cada vez mais o descontentamento do povo com a situação política do país. Durante a ocupação japonesa os poemas ganhavam força para desabafos; um refúgio. E logo com a divisão das Coreias, as obras sul coreanas falavam sobre os desafios e a desigualdade no país.

Poesias líricas são mais comuns de serem encontradas pelos autores sul-coreanos, onde não se trata apenas de um poema presente em coletâneas, mas uma poesia que conta uma história, mas que se difere da prosa, outro gênero textual bem comum encontrado entre obras dos autores coreanos.


Kim Yi-deum (1969)

Kim Yi-Deum
Fonte: Cordite (reprodução)

A forte escrita de Kim Yi-Deum traz em pauta o feminismo e a marginalização da mulher no meio da escrita. Ela utiliza da poesia para enaltecer fortes personagens femininas, que enfrentam o machismo no cotidiano; e ao mesmo tempo utiliza de sua escrita para exteriorizar o que há de profundo em seu coração e indignações em sua mente. Kim Yi-deum fez sua estreia literária em 2001 com Poesie. Seus livros incluem três coleções de poesia, A Stain in the Shape of a Star (2005), Cheer up, Femme Fatale (2007), Inexpressible Love (2011), e a novela Blood Sisters (2011). Ela recebeu seu PhD com sua tese sobre “Poemas Feministas na Coreia” e tem ensinado na Universidade Kyungsang.

Eu sou como Borges ditando uma história;

Eu me escrevo na ficção

se você me vê ou não.

Só quando o que você pensa que é verdade desaparece

a verdade real surge

porque não há nada por trás da fachada.

Trecho de Hysteria.

Em 2012, permaneceu como escritora residente na Free University of Berlin, participando do Programa Writer-in-Residence Abroad do Arts Council Korea (ARKO). Ela também participa por cortesia do Instituto de Tradução de Literatura da Coreia. Atualmente trabalha como colunista de um jornal de Busan, como apresentadora de um programa de rádio com tema poético e recentemente abriu uma cafeteria literária, chamada “Kim Yi-Deum coffees and books”

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Kim Chun-Su (1922 – 2004)

Kim Chun-Su
Fonte: KLN – Korea Literature now (reprodução)

Um dos poetas mais influentes para a Coreia em meados no século XX, e que, mesmo após sua morte em 2004, continua a ser exaltado por suas “poesias que parecem mais uma pintura”, devido aos mínimos detalhes presentes em seus versos. Nascido em 1922 em Chungmu, cidade na Costa Sul da Coreia, Chun-Su utilizava de sua poesia para enaltecer a natureza, principalmente o mar. Foi aluno de uma prestigiada universidade em Seul, e seu talento o levou para o Japão, onde sonhou em estudar, mas foi interrompido por soldados japoneses e preso em Tóquio; após cumprir sete meses de prisão, foi mandado de volta para o país de origem durante a ocupação japonesa na Coreia. Chun-Sun ficou anos escondido até que o país fosse liberto, após isso dedicou sua vida a escrever poemas e a lecionar para universitários, além de utilizar de sua inteligência para contribuir com textos acadêmicos e estudos referente a poesia coreana. Foi reconhecido com prêmios diferenciados, como o Asian Free Literature Award (1959) e o South Kyongsang Cultural Award (1966). Ele foi eleito membro da Academia de Artes da Coreia em 1981.

Um dos versos de Chun-Sun está presente na letra da canção “Serendipity” interpretada por Jimin do BTS. O trecho “quando você chama por meu nome, eu me torno sua flor”, cantado aos 00:31 da canção, é um verso da poesia “A Flor”:


Antes de eu chamar pelo seu nome,

Ela não era nada

Além de um gesto.

Quando eu chamei pelo seu nome,

Ela veio até mim,

E em uma flor se transformou

Da mesma forma que eu chamo pelo seu nome,

Alguém chamará pelo meu nome e

Haverá de convir com a minha luz e minha fragrância?

Eu também desejo chegar até ela,

E transformar-me em sua flor

Todos nós ansiamos nos tornar em algo,

De ti para mim, e de mim para ti,

Nós desejamos nos transformar em um olhar,

Que não será esquecido

A Flor


Kim Hye-Soon (1955)

Kim Hye-Soon
Fonte: Poetry Foundation (reprodução)

Enquanto muitos homens coreanos são conhecidos há séculos por seus poemas, as mulheres coreanas são fragilizadas até mesmo pela forma em que são descritas quando apresentam suas obras. “Espera-se que mulheres escrevam sobre romance, algo gentil, doce e fofo, e que encarem seus papéis como esposas para servirem seus maridos”, contou Hyesoon em entrevista para a a Revista Gernica em 2012. Hyesoon faz tudo diferente do que se espera de uma poetisa coreana. Seus poemas são carregados de gore, terror, horror e muita violência, mas tudo isso com o propósito de falar sobre o machismo presente no país.

Kim Hye-Soon é uma das mais importantes poetisas de hoje, pois suas obras ultrapassam as barreiras de seu país, sendo apreciada internacionalmente. A autora possuí uma bagagem importante: foi a primeira mulher poetisa a receber os prestigiosos prêmios Kim Su-yong e Midang, ambos nomeados em homenagem a poetas contemporâneos do sexo masculino. Apareceram três traduções para o inglês da poesia de Kim, de Don Mee Choi. When the Plug Gets Unplugged (Tinfish Press, 2005), Mommy Must Be a Fountain of Feathers (Action Books, 2008) e All the Garbage of the World, Unite! (Action Books, 2011) são uma introdução maravilhosa ao trabalho de Kim. Uma seleção de traduções dos poemas de Kim ao lado do coreano original pode ser encontrada em Anxiety of Words: Contemporary Poetry by Korean Women, também traduzido por Don Mee Choi. Embora a poesia de Kim seja bem conhecida em toda a Coreia, ela também é uma respeitada autora de crítica literária e membro da Outra Cultura, uma organização feminista coreana. 

Mulheres que desapareceram pela violência estão gritando. As vozes de mulheres desaparecidas estão ecoando. Eu canto com essas vozes.

Kim Hye-Soon.

Seu último trabalho é “Autobiografia da Morte” e pode ser encontrado na Amazon (em inglês) para a versão física e Kindle, assim como a obra “I’m Okay, I’m Pig”.


Adquira as obras aqui:


Cho Nam-Sun (1890 – 1957)

Cho Nam-Sun
Fonte: KoreaTimes (reprodução)

O nacionalista Choi Nam-Sun foi primeiro poeta coreano de versos em estilo livre moderno na virada do século 20, e também publicou revistas para jovens para educar e esclarecer seus semelhantes durante o domínio colonial japonês. Ele escreveu a Declaração de Independência em 1º de março de 1919, que tinha um erro de digitação, e redigiu a Declaração com muita pressa sozinho. Através de seu pseudônimo Yundang, o poeta declarou: “Nós, por meio deste, declaramos Joseon como um país independente e nós mesmos como uma nação soberana”.


Trecho da Declaração da Independência da Coreia escrita por Choi Nam-Sun.
Fonte: Reprodução.

No início seu trabalho reforçava todo o amor que sentia pela Coreia, enaltecendo a beleza da natureza e de pequenos detalhes encontrados entre seu povo. O poeta também fazia questão de falar sobre o mar, filosofando sobre a importância de buscar conhecimento além do que o cercava. Também defendia em seus textos a importância da mitologia, das lendas para a história de um povo, pois elas se tornavam a filosofia, arte e também parte da história. 

Quem pode ser uma grande pessoa sem entrar em contato com o oceano? A juventude de grande Coreia, cercada por mares e oceanos em três lados, deve estar ativa em torno deles no futuro. Eles deveriam brincar e aprender com os mares e oceanos…

(Ch’oe Nam-so˘n 1909c).

A versão em inglês da obra de Cho Nam-Sun está disponível na Amazon através desse link.


Kim Ki-Taek (1957)

Kim Ki-Taek
Fonte: Reprodução

O poeta contemporâneo tem ganhado espaço na mídia internacional por seus textos que retratam a desigualdade social na Coreia do Sul. Kim Ki-taek nasceu em 1957 em Anyang, Gyeonggi-do, e iniciou sua carreira poética após vencer o Concurso Literário Anual de Primavera com os poemas “Um corcunda” e “Seca”. Publicou vários livros de poesia, incluindo Chewing Gum, Fetal sleep e Storm in the Eye of a Needle (publicado em japonês, 2014). Ele atraiu a atenção da crítica com seu estilo de descrição único, seco e racional. Em reconhecimento ao seu talento excepcional, ele recebeu o Prêmio Literário Kim Soo-Young (1995), o Prêmio Literário Hyundai (2001), o Prêmio Literário Isu (2004), o Prêmio Literário Midang (2004), o Prêmio Literário Jihoon (2006), o Prêmio Poeta Sanghwa (2009), o Prêmio Literário Kyung Hee (2009) e o Prêmio Literário Pyeonun (2013). 

Chiclete que alguém mastigou e cuspiu.

Goma com marcas de dentes bem visíveis.

Goma moldada em uma pequena bola redonda

depois de ser amassado e dobrado sobre si mesmo em um minúsculo compacto de vincos;

sem descartar ou apagar nem mesmo um

das incontáveis marcas de dentes

sobre marcas de dentes pré-existentes.

Goma de Mascar – Ki Kitaek

Adquira a obra aqui:



Ao longo da história da Coreia inúmeros poetas surgiram para declarar seu amor pelo país, ou para falar dessa conexão do homem com a natureza, tão importante que se faz presente em lendas sobre a história e fundação da Coreia. Atualmente vozes femininas ganham força e se colocam como pioneiras em divulgar a escrita coreana. 

Aproveite o Dia Mundial da Poesia para conhecer uma literatura diferente da brasileira, onde poemas contam histórias de libertação, indignação com a sociedade atual, desabafos e muito – muito mesmo – amor.

Fontes: (1), (2), (3), (4), (5), (6), (7), (8), (9), (10), (11), (12), (13), (14), (15), (16), (17), (18), (19), (20), (21), (22) e (23).  
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  • Isabela Marques

    Jornalista do interior de SP. Tenho 29 anos e quase metade deles foram dedicados ao mundo geek asiático. Quando não estou sendo uma boa fangirl, aproveito para ler bons livros e webtoons de mistério.

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