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[ENTREVISTA] Escritora sul-coreana Hwang Bo-Reum fala sobre encontrar cura e conforto através dos livros

Você conhece o livro Bem-vindos à Livraria Hyunam-Dong? A autora Hwang Bo-Reum concedeu uma entrevista exclusiva à KoreaIN durante sua passagem pelo Brasil para a Bienal do Livro de São Paulo e para um encontro no Centro Cultural Coreano. A escritora compartilhou suas impressões sobre o carinho dos fãs brasileiros e a importância de sua obra ao redor do mundo.

Hwang Bo-Reum falou também sobre a jornada que a levou a deixar uma carreira em ciência da computação e seguir carreira na escrita. Confira a seguir!

KoreaIN: Olá, muito obrigada por conversar com a KoreaIN hoje. Gostaria de saber como está sendo esta viagem ao Brasil e o encontro com seus fãs de um país tão distante. Como se sente sabendo que suas palavras alcançaram tantas pessoas ao redor do mundo?

Hwang Bo-Reum: Olá, eu sou Hwang Bo-Reum, autora de ”Bem-vindos à Livraria Hyunam-Dong”. Muito prazer. Cheguei ao Brasil, participei ontem da Bienal do Livro e hoje estou no Centro Cultural Coreano do Brasil para encontrar meus fãs. Embora a Coreia e o Brasil sejam países muito distantes, me senti muito bem e recebi muito carinho. Fiquei pensando sobre isso e que [esta] foi uma oportunidade única que talvez nunca mais terei. Fiquei muito grata por isso. E sobre o fato de lerem o meu livro num lugar tão distante assim, penso da seguinte forma, a partir de um ponto: É o meu livro, mas tem muita coisa que eu não sei sobre ele. Porque quando eu escrevi este livro, escrevi só pensando em como seria bom se as pessoas se sentissem confortáveis lendo o meu livro. Mas as pessoas que leram meu livro parecem sentir outras coisas além do conforto. Muitos escritores falam que é o escritor que escreve e publica o livro, mas depois deste momento [a publicação], o livro é dos leitores. E eu acho que o meu livro é assim.

KoreaIN: ⁠Seu livro ganhou popularidade por trazer profundas reflexões sobre a vida e, ao mesmo tempo, oferecer conforto aos leitores. Como você se sente ao saber que sua escrita tem ajudado tantas pessoas a lidarem com suas questões pessoais e mentais?

Hwang Bo-Reum: Primeiramente, todos os personagens que aparecem no meu livro têm algum tipo de falta, dificuldade ou feridas não cicatrizadas. Enquanto escrevia o livro, queria que essas dificuldades dos personagens fossem, nem que seja um pouco, melhoradas, que os personagens pudessem fugir um pouco de tudo isso. Para isso, a primeira solução é mudar de ambiente. Sei que isto não é fácil e nem acontece de uma hora para outra, mas sim de forma mais lenta. A pessoa tem que lidar com isso. Eu espero [desejo] que este mundo seja um lugar fácil de se viver, mas infelizmente não é assim. O que podemos fazer é encontrar a mudança dentro de nós e nos apoiar para tornar realidade. Com isso, os personagens do meu livro…, Jeongseo, por exemplo, medita; Minjun conecta o trabalho de fazer o café com as dúvidas da vida. E assim, pouco a pouco, eles vão mudando o seu interior. Acredito que os leitores, enquanto leem e acompanham essa mudança deles, recebem conforto.

KoreaIN: Você já comentou em outras entrevistas que não se baseou em nenhuma livraria específica para criar o livro “Bem-vindos à Livraria Hyunam-Dong”, mas sabemos que o espaço da livraria traz conforto a diversos personagens da obra. Gostaríamos de saber se você também tem um lugar assim.

Hwang Bo-Reum: Não tenho um lugar específico como a livraria Hyunam-Dong. Claro que há lugares onde me sinto confortável, mas não existe um local particular onde posso encontrar conforto. Escrevendo este livro, quis descrever um lugar fictício que eu mesma não encontrei. Mas por outro lado, me fazem muitas perguntas assim, como “consigo achar um lugar assim?”, “existe algum lugar assim pra mim?”. Eu respondo se é necessário ter um lugar físico para sentir conforto. Qualquer lugar onde se possa criar boas relações pode ser um refúgio como a livraria. As relações que são criadas são mais importante do que os espaços.

KoreaIN: Antes de se tornar escritora, você cursou Ciência da Computação e seguiu uma carreira nessa área. Em que momento percebeu que essa não era a sua verdadeira paixão e como foi o processo de transição para a escrita?

Hwang Bo-Reum: Eu trabalhei 7 anos numa empresa, mas já nos primeiros meses percebi que não combinava com o trabalho, mas aguentei. Saí com 30 anos, porém tomei essa decisão aos 29. Após minha saída, não pensava que queria ser escritora, inclusive estava trabalhando com outras coisas. Um dia, do nada, percebi que queria seguir esta carreira. Nunca tinha escrito antes, mas estava no processo, então comecei a escrever. Nesse início eu pensei que tinha que me dedicar e me esforçar muito, por isso nos primeiros 3-5 anos, lembro que escrevia muito e assim me tornei escritora.

KoreaIN: Que conselho você daria para alguém que deseja mudar de carreira, se tornar escritor ou iniciar um novo sonho?

Hwang Bo-Reum: Hoje em dia, qualquer pessoa que quer se tornar escritor pode se tornar um. Não estamos mais na época em que se tornar escritor era uma dificuldade, você pode se tornar se quiser. Só acho que as pessoas estão com muita pressa, vejo relatos daqueles que sofrem logo após tomar a decisão de seguir esta carreira, porque não conseguem atingir o que querem. Se tiver um objetivo fixo e escrever 3, 4, 5 anos, quando encontrar uma história que quer contar, você chega lá, é só não ter pressa.

É difícil eu falar alguma coisa para o pessoal que está pensando em mudar de carreira. Tento ser muito cautelosa ao abordar este assunto, porque quando eu saí do meu primeiro emprego, não tinha plano nenhum e agora me tornei escritora. No início, quando escolhemos outra profissão, parece que tudo vai dar certo, mas sabemos que esse tipo de transição não ocorre de maneira fácil. Para as pessoas que optam por mudar de carreira olhando o meu exemplo, eu oriento a não fazer isso. Ao meu redor tem muitos escritores que possuem outros empregos, alguns têm dois ou um emprego fixo, e somente depois de muitos anos de transição optam pela saída definitiva. Então, caso esteja querendo mudar, eu gostaria de te dizer para ir tentando pouco a pouco.

KoreaIN: Na sua opinião, o que faz de um livro uma boa leitura e quais elementos ele precisa ter para cativar o leitor?

Hwang Bo-Reum: Como autora, acho que posso pensar em inúmeras coisas. Tem que ser pessoal, mas tem que ultrapassar o pessoal. Tem que escrever algo que não seja entediante, nem muito óbvio. Tem que mostrar o pensamento e o universo do escritor, além da técnica de escrita, as frases [devem ser] bem escritas. Lembro de muitas coisas sem pensar do ponto de vista do escritor, mas pensando do ponto de vista do leitor, se eu li um livro e gostei, [se o livro] me ajudou, então é uma boa leitura. Pode ser que quando eu ler possa parecer muito infantil e que não me toque em nada, mas para um outro leitor esse livro pode ter mudado a vida, ou quando estava passando por um momento difícil, deu forças e ajudou a superar. Nesse caso, acho que ninguém pode dizer que é um livro ruim, então acho que quem pode dizer se um livro é bom ou ruim são apenas os leitores.

Para cativar o leitor, sendo sincera, acho que não sei também. Seja livro ou história, tem coisas que fazem as pessoas pensarem. Tem que ter suspense, personagens com divisão clara de bem e mal, algum conflito, existem todas essas condições, mas “Bem vindos à Livraria Hyunam-Dong” não tem nada disso. Tanto que uma das coisas que mais comentam comigo lá na Coreia do Sul é que o livro não tem vilão. Como que pode só ter personagens bons? Mas apesar dos personagens da Livraria Hyunam-dong não terem essas características, as pessoas têm lido bastante. Então acho que não dá pra falar sobre alguma condição. Mas sim uma coragem por parte do autor [para] que possa levar até o fim aquilo em que ele acredita. Acho que isso tem que ser a primeira condição e com certeza seguido pelo leitor.

Mas existe uma coisa que eu sempre me esforço: Eu tento cativar em cada frase. No processo onde escrevo uma frase e passo para a próxima, tento praticar aquilo que já falei antes, que é não deixar entediante e nem óbvio. Evito escrever coisas que qualquer um poderia dizer, que não fazem diferença se ditas ou não. Pensando sempre nisso, eu vou escrevendo frase por frase. É a única metodologia que eu sigo.

KoreaIN: Por fim, você poderia deixar uma mensagem para os seus fãs brasileiros e para quem está conhecendo agora “Bem vindos à Livraria Hyunam-Dong”?

Hwang Bo-Reum: Os primeiros comentários que recebi na Coreia do Sul depois de ter lançado o livro lá foi em sua maioria: “foi reconfortante”, “graças à livraria Hyunam-Dong, posso pensar de forma mais positiva sobre a vida”, “aprendi a confiar na minha decisão”. Então, caso você esteja num momento de dificuldade na sua vida, penso que ler este livro pode te ajudar. E lembre-se: é mais divertido do que parece.

por Yulle Santos e Beulla Silva
Imagem: Seong Ji Min, Clayhouse Inc.
Não retirar sem os devidos créditos.

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