Histórias em quadrinhos não precisam retratar apenas a ficção e o mundo da fantasia. A autora sul-coreana Keum Suk Gendry-Kim é o tipo de artista que usa seu talento para contar histórias e desenhar para retratar pessoas e temas reais. Ela conta histórias sobre traumas e dificuldades com uma delicadeza que ensina e acolhe ao mesmo tempo, e algumas de suas obras também estão disponíveis em português no Brasil. Descubra com a KoreaIN mais sobre a história de Keum Suk Gendry-Kim e as histórias que ela conta e que você pode ler.
Leia também: [LISTA] 5 livros para conhecer mais sobre a história e memória da cultura sul-coreana
A história da própria Keum Suk Gendry-Kim
Para entender as obras de Keum Suk Gendry-Kim é importante conhecermos a autora, já que muitos dos seus trabalhos refletem diretamente a experiência de vida que ela e a família tiveram, e isso desde pequena.
A autora nasceu em 1971 em Goheung, uma região rural bem ao sul da península coreana. Por questões financeiras, logo pequena se mudou com a família para Seul. Ela estudou pintura com estilo ocidental e aos 23 anos se mudou para Paris para se especializar em esculturas em uma escola de artes francesa.
Para se manter financeiramente enquanto tentava encontrar seu lugar no mercado artístico e usando seu conhecimento em ambos idiomas, ela começou a trabalhar como tradutora de quadrinhos coreanos para francês. Até então uma artista mais “tradicional”, Keum Suk Gendry-Kim um dia foi chamada por um contato em um jornal francês para publicar seus próprios quadrinhos.
A essa altura, ela já estava fascinada pelos quadrinhos como forma de arte, especialmente na possibilidade de contar histórias usando imagens para montar o fluxo de uma conversa, uma característica que se tornou ponto-chave de suas próprias histórias desde o princípio.
Ela começou a explorar mais o mundo dos quadrinhos por conta própria ainda na França, até se mudar de volta para a Coreia do Sul com seu marido Loïc Gendry em 2011, onde hoje vivem na Ilha Ganghwa, ao noroeste do país e na divisa com a Coreia do Norte. Foi só após voltar para a Coreia do Sul que publicou o seu primeiro livro de histórias em quadrinhos, uma obra quase autobiográfica, na época apenas na França e em francês: Le chant de mon père.
Este, assim como os primeiros trabalhos da autora, não foi traduzido para o português até o momento, mas poderia ser chamado de “A canção do meu pai” e retrata uma família que muda do interior para a capital, assim como ela própria viveu, incluindo memórias de seu pai cantando pansori antes de mudarem de vida.
Desde então, Keum Suk Gendry-Kim passou a intercalar seu trabalho entre quadrinhos curtos e livros inteiros em francês e em coreano até o lançamento da sua obra mais popular até hoje, que faria seu trabalho viajar pelo mundo até o Brasil.
As obras Keum Suk Gendry-Kim no Brasil
Até o momento da publicação desta matéria, em junho de 2025, foram publicados cinco livros da autora em português no Brasil. Confira quais são:
Grama (2020)

O livro de 2017, 풀(Pul), ou Grama, como foi intitulado ao ser lançado no Brasil pela primeira vez pela editora Editora Pipoca & Nanquim, é o mais famoso da autora até então e por um bom motivo. Grama é uma história em quadrinhos baseada na história real de Ok-sun Lee, que quando criança foi vendida pelos pais e forçada a trabalhar pelo Exército Imperial Japonês como uma “mulher de conforto”.
Os relatos tristes diretos de uma Ok-sun Lee de 90 anos foram eternizados na obra de Keum Suk Gendry-Kim, que por sua vez mostra essa realidade séria de muitas meninas na época e ressalta os sentimentos e a força que mulheres como Ok-sun Lee tiveram que ter para se manterem vivas.
Por causa desse trabalho cuidadoso e real, Grama e Keum Suk Gendry-Kim receberam dezenas de indicações e prêmios ao redor do mundo. O reconhecimento fez com que mais pessoas pelo mundo se interessassem pela sua obra e, por isso, Grama foi traduzido para cerca de 15 idiomas até o momento. Com isso, suas obras posteriores também ganharam versões em português e em outros idiomas.
A Espera (2021)

Enquanto Grama ainda recebia prêmios e acabara de chegar ao Brasil, a autora lançou A Espera. Desta vez, a inspiração para a obra foi sua própria mãe, assim como Le chant de mon père foi sobre seu pai. No final dos anos 1990 quando ainda morava em Paris, sua mãe a visitou e durante seu período na cidade contou que tinha uma irmã mais velha, tia de Keum Suk Gendry-Kim, que morava na Coreia do Norte. Elas haviam se separado durante uma viagem e não conseguiram mais se ver após a separação da península.
Na época, a mãe da autora passava por mais um período de esperança e então frustração quando não foi selecionada para um programa de reunião de famílias. Conhecer esta história sobre a sua família fez com que Keum Suk Gendry-Kim decidisse abordar o tema de separação de famílias, infelizmente comum.
Jun (2022)

Os quadrinhos de Keum Suk Gendry-Kim são como relatos de pessoas que ela conhece e sempre possuem um trabalho complexo de entrevistas e conversas para mostrar situações reais através da arte. Foi o que aconteceu em Jun, também uma história real, desta vez sobre um menino autista com talento na música que ela conheceu em 2010. O livro retrata o cotidiano de Jun e sua família e a frequente luta por aceitação e contra preconceitos.
Cães (2023)

Keum Suk Gendry-Kim voltou a trabalhar um assunto quase autobiográfico em sua obra seguinte, Cães, publicado na Coreia do Sul em 2021 e no Brasil em 2023. É um livro com várias camadas da sua relação com os animais de estimação, desde a inicial recusa a adotar um cachorro, até a eventual adoção por insistência do marido, para então passar a amá-los incondicionalmente. A sua nova vivência com cachorros a fez falar sobre a relação entre o ser humano e os animais e, como não poderia deixar de ser, sobre o problema sério dos casos de maus-tratos ainda infelizmente frequentes.
Meu Amigo Kim Jong-un (2023)

Por fim, a obra mais recente de Keum Suk Gendry-Kim na Coreia do Sul e no Brasil se chama Meu Amigo Kim Jong-un. O título é tão provocante quanto a obra, que é um misto de biografia do líder norte-coreano, experiência de pessoas ao redor, como o ex-presidente sul-coreano Moon Jae-in e desertores sul-coreanos, e também contos pessoais como alguém que vive na fronteira entre os países em meio a períodos de tensão e calmaria, de desinformação e de busca pela paz.
Todas as obras de Keum Suk Gendry-Kim trazem assuntos sérios e fazem o leitor pensar, mas ao mesmo tempo com uma narrativa leve e empática que traz um caminho de esperança se decidirmos seguir por ele. Para quem se interessou em ler, seus livros que foram publicados no Brasil podem ser encontrados em livrarias físicas e lojas virtuais.
Por Paula Bastos Araripe
Fonte: (1), (2), (3), (4), (5)
Imagens: Editora Pipoca e Nanquim/Amazon
Não retirar sem os devidos créditos.