O último episódio de Marry My Husband foi transmitido na terça-feira (20) e trouxe reflexões como a importância do amor próprio e da coragem para sair de relações tóxicas. Ao longo de sua trama, a série abordou temas como traição e a chamada Lei do Adultério, que ficou em vigor por 62 anos e estipulava que qualquer marido ou esposa que traísse o parceiro poderia levar punições que iriam de pequenas multas até dois anos de prisão.
Conheça mais sobre esta lei mencionada na história do K-drama.
O K-drama
Vítima de adultério, traída pela melhor amiga e por seu marido, Kang Ji Won (interpretada por Park Min Young) é assassinada pelo parceiro, mas ganha uma segunda chance, voltando no tempo. Como o que está destinado a acontecer, sempre acontecerá, ela deve achar alguém para “pegar o seu destino”. Como projeto de vingança, Ji-won escolhe fazer com que a melhor amiga case com seu marido e, portanto, se torne a esposa traída e assassinada.
Yang Joo Ran (interpretada por Gong Min Jeung) é uma colega de trabalho de Ji Won que, assim como a protagonista, é gentil até demais. Ela acaba deixando os outros “passarem por cima dela” e, com isso, também se encontra em um casamento tóxico, com um marido que não trabalha, não ajuda nos afazeres de casa, não ajuda a cuidar da filha e ainda por cima a trai. Joo Ran utiliza, então, da Lei do Adultério ainda estava em vigor em 2013, ano em que se passa a história.
Para denunciar o marido utilizando a lei e conseguir preservar mais direitos durante o processo de divórcio, Joo Ran precisava de uma prova concreta da traição. A personagem teve acesso a gravações do marido com a amante em seu carro, porém, apenas o áudio estava funcionando. Joo Ran foi capaz de ouvir tudo que os dois fizeram e falaram, inclusive as atrocidades que falaram sobre ela. No entanto, como o vídeo não estava funcionando, a gravação não era prova suficiente. Era preciso então que Joo-ran chamasse os policiais em um momento chave e tentasse flagrar o marido no ato da traição.
A Lei do Adultério
Esta lei foi criada com o objetivo de finalmente também punir os homens por qualquer relação desenvolvida fora do casamento. Anteriormente, apenas mulheres casadas eram punidas pela lei coreana por traírem os maridos. A punição apenas para as mulheres era justificada pela cultura confucionista milenar em que era permitido aos homens durante a Dinastia Joseon ter, além da primeira esposa, uma segunda e terceira esposas, concubinas e quantas mais mulheres fosse necessário para saciar suas vontades. Enquanto isso, as mulheres, que eram vistas como castas, puras e subservientes ao homem, deveriam apenas se dedicar ao marido. Ao longo dos séculos, foi permitido e normalizado que homens coreanos traíssem e possuíssem atração sexual por diversas mulheres. Este mesmo comportamento era repudiado e criminalizado quando se tratava de mulheres.
Com as mudanças sociais decorrentes das guerras do século XX, as mulheres entraram com força no mercado de trabalho e passaram a ser vistas como iguais perante a lei a partir de 1948. A nova Lei do Adultério, que surgiu logo depois, em 1953, estipulava que ambos os gêneros, igualitariamente, poderiam ser punidos e processados por crime de adultério. Ao extender a punição aos homens, a lei permitia que mulheres — ainda muito dependentes financeiramente dos homens — pudessem receber indenizações após o divórcio. Elas não precisariam mais se manter em relacionamentos infiéis para poderem sobreviver e se sustentarem.
A abolição da lei
Com o passar de seis décadas, as coreanas se inseriram completamente no mercado de trabalho e já não apresentavam extrema dependência financeira de seus maridos. Por esse motivo, a lei foi revogada, fazendo com que ninguém fosse preso por trair no casamento, nem homens nem mulheres. A lei também tinha se tornado um meio para que grupos confucionistas — que pregavam tradições patriarcais da Dinastia Joseon — reforçassem seus discursos misóginos através da ênfase na punição de mulheres. Estes grupos enfatizavam a submissão feminina ao marido. A abolição da lei foi apoiada por grupos feministas, que viam a lei como uma forma de grupos confucionistas manterem sua influência.
Após a abolição, dados mostraram que, apesar de serem menos dependentes, as mulheres sul-coreanas ainda eram financeiramente mais fracas que os homens, com a disparidade salarial entre homens e mulheres chegando a quase 32% em 2020. Isto significa que, ainda em 2020, homens recebiam 31,5% a mais que mulheres. Em um possível divórcio, as mulheres ainda são mais prejudicadas com a desigualdade de salários.
De acordo com o Fórum Mundial de Economia de 2021, a Coreia do Sul está no 102º lugar de uma lista com 156 países quando se trata de Desigualdade de Gênero. A Lei do Adultério serviu ao seu propósito por 62 anos, mas, para resolver o problema da desigualdade pós-divórcio, outras medidas devem ser tomadas, como a igualdade salarial. Como os dados de 2021 mostram, a Coreia do Sul ainda deverá percorrer um longo caminho para que isso possa acontecer.
Fonte: (1), (2), (3)
Imagens: tvN, reprodução
Não retirar sem os devidos créditos.