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Datas comemorativas Ensino e Educação

Dia do Hangul: uma comemoração ao alfabeto e pela democratização da educação

Em 9 de outubro, a Coreia do Sul celebra o dia em que o Hangul (한글) foi anunciado, abrindo portas para uma alfabetização mais justa. Conheça a origem e importância da data.

Leia mais: A história, revolução e importância do HANGUL, o alfabeto oficial coreano



Quando falamos de alfabeto podemos nos referir a diversos sistemas de escrita, muitos dos quais foram surgindo e evoluindo conforme os séculos passavam e adaptações eram feitas. O Hangul (한글), contudo, surgiu como uma forma de democratizar a alfabetização coreana, visto que antes de ser criado especificamente para expressar e comportar o idioma já existente na península, o sistema de comunicação escrita era o Hanja (漢字), composto por ideogramas chineses. Em 9 de outubro é celebrado o Hangul-nal (한글날), ou Dia do Hangul, relembrando o momento histórico em que o Rei Sejong instaurou o uso de símbolos que traduziam de forma acessível as palavras coreanas.

O Hangul é um dos sistemas de escrita mais novos registrados pela humanidade. Em uma comparação, o alfabeto romano (o padrão utilizado em países colonizados pelos europeus) teve seu formato oficial definido como conhecemos hoje em 700 a.C, enquanto o alfabeto chinês data de 1.500 a.C, o mais antigo no mundo ainda empregado. O alfabeto coreano, no entanto, surgiu em 1446 d.C como uma forma de aprimorar a alfabetização na península através do acesso à educação e às artes.

Durante séculos a península coreana foi alvo de invasões e ocupações, principalmente por exércitos chineses, mongóis, japoneses e – posteriormente – soviéticos. Em 108 a.C, quando os exércitos da Dinastia Han chegaram à Coreia, o alfabeto chinês passou a ser usado nos arquivos históricos e poemas épicos, tendo como método principal o Hanja, passado à elite através de dogmas budistas e outros materiais ligados à filosofia confucionista. A técnica era impraticável para a esmagadora maioria dos coreanos, pois era composta por camponeses e fazendeiros que não tinham condições, tempo e nem acesso aos meios de aprendizado. Logo, toda a retratação dos eventos e traduções de palavras e expressões para a linguagem era feita por ricos, realeza e monges nos monastérios.

Esse cenário continuou sendo reproduzido por dinastias de reis coreanos, passando pela transformação dos três grandes reinos (Silla, Baekje e Goguryeo) e chegando ao período de Joseon (1392 até 1910), quando em 1443 d.C, o Rei Sejong – considerado um ícone benevolente, grande revolucionário por suas escolhas políticas, como alfabetizar mulheres e plebeus, sendo chamado de “Herói do Povo” – concluiu que a melhor forma de fazer Joseon crescer e se tornar uma grande potência era fortalecer a cultura coreana, fazendo dela o mais independente possível através do próprio alfabeto. Assim, poderia-se dar liberdade para que a população se expressasse e escrevesse os próprios pensamentos. O monarca, então, se juntou a um grupo de jovens acadêmicos para trazer à vida um alfabeto acessível e simples. Inspirados pela natureza e a conexão entre o mundano e o divino, surgiram caracteres únicos que se encaixavam em sílabas, também respeitando as formas como a língua se movia durante a pronúncia das palavras em coreano.

Em 9 de outubro do ano de 1446 a.C foram publicadas as primeiras cópias dos livros Hunminjeongeum Haerye (훈민정음 해례, ou “Explicações e Exemplos dos Sons Apropriados para a Instrução do Povo), ou somente Haerye, um compilado ensinando o uso da nova ferramenta de escrita, através de textos reunidos por Jeong In-ji, Vice-Ministro da Educação no reinado do Rei Sejong.

‘A língua coreana é diferente do idioma chinês, e os ideogramas chineses não a traduzem bem o suficiente. Este é o motivo porque pessoas comuns querem e não conseguem expressar seus sentimentos, e isso é uma situação comum. Movido pela compaixão, criei vinte e oito caracteres que podem ser aprendidos com facilidade por todos e usados no cotidiano.’

Frase dita pelo Rei Sejong, defendendo a criação do Hangul e o direito de educação coletiva.

As intenções do rei e a simplicidade da nova ferramenta de escrita não foram bem vistas por uma parte da elite, especialmente pelos Yangban (양반), um grupo de aristocratas, funcionários do governo e acadêmicos Confucianos. Esse seleto conjunto de indivíduos regulava e burocratizava a política em Joseon. A recepção deles foi fria, mas camponeses e mulheres aderiram ao Hangul, pois puderam colocar em palavras escritas suas lembranças, esperanças e pensamentos sem o auxílio de estudiosos. Mesmo o mais simples dos homens poderia se tornar literato com ele, pois, como dito pelo Rei Sejong, qualquer um poderia aprender o Hangul: os mais estudados compreenderiam e decorariam em uma hora, enquanto uma pessoa com menos instrução chegaria aos mesmos resultados em 1 semana.

Cópia de parte do livro Hunminjeongeum Haerye (훈민정음 해례), a primeira publicação apresentando o alfabeto Hangul, criado por jovens acadêmicos ao lado de Rei Sejong em 1446.
Fonte: The Transformation of Kansong Exhibition

Em 1504, mais de meio século após a morte do Rei Sejong (falecido em 1450), durante o reinado do Rei Yeongsangun, o ensino e uso do Hangul foi oficialmente proibido após uma série de pôsteres caçoando dele usando o “alfabeto do povo”. Considerado um dos Reis mais tiranos da história coreana, determinou que somente o Hanja fosse usado. Todos os ministros que se opuseram foram desmembrados e tiveram familiares mortos. Diversos poemas, livros, músicas e textos foram escritos utilizando o Hangul e o ensino dele continuou firme, mesmo que de forma marginal.

O Hangul só começou a ser respeitado em todas as camadas em meados de 1890, num período em que a corrupção, analfabetismo e batalhas constantes estavam destruindo as fundações coreanas. Nesse momento atribulado, o Rei Gojong estabeleceu entre 1894 e 1896 a Reforma Gabo (갑오 개혁), abolindo a escravidão, o domínio dos Yangban e as castas sociais e tornou o sistema educacional e trabalhista um meio democrático e meritocrático. Outra forma de criar adesão à acessibilidade foi mandar reescrever todos os documentos governamentais usando o Hangul; os jornais e as aulas também passaram a usar o sistema de escrita.

Pouco tempo depois o uso do Hangul foi novamente abolido. Desta vez em 1910, com a anexação da península pelo império japonês. A tentativa de apagar a cultura coreana (desde suas lendas até o idioma) do território era feita sob a premissa de “civilizar os habitantes coreanos”. As medidas de censura se tornaram ainda mais intensas após os levantes em 1º de março de 1919 e a série de protestos que seguiram por um ano. Em 1938 foi tomada a medida mais severa: qualquer manifestação de orgulho nacional era reprimida com violência extrema pelo exército nipônico.

Apesar da repressão, o Hangul e o coreano continuaram sendo desenvolvidos e cultivados através de estudos e registros da Sociedade da Língua Coreana (한글 학회). Entre 1912 e 1930, a organização fez grandes esforços para a criação de um dicionário coreano, contendo regras e significados, cultivando inteiramente um idioma e um alfabeto legítimos. Em 1926 foi celebrado o primeiro Dia do Hangul, na época comemorado em 29 de setembro. 

Ao fim da Segunda Guerra Mundial, com os países do Eixo (Japão, Itália e Alemanha) sendo condenados a libertar todos os territórios anexados, a Coreia se tornou livre e tomou a decisão de adotar oficialmente o Hangul como seu alfabeto. No mesmo ano, o Dia do Hangul passou a ser oficialmente celebrado em 9 de outubro, em memória ao dia da primeira publicação do Hunminjeongeum Haerye.

Estátua de bronze do Rei Sejong, o Grande, na Praça Gwanghwamun em Seul.
Fonte: 대한민국 구석구석

Na Coreia do Sul, atualmente, a data é celebrada com uma visita ao museu Rei Sejong, que tem sua entrada na parte de trás da estátua de 6.2m, esculpida em bronze e instalada em respeito a Sejong, o Grande, na frente da Praça Gwanghwamun, próximo ao Palácio Gyeongbokgung e ao Portal de Gwanghwamun, em Seul. A construção foi inaugurada em 2009, no 563º aniversário da invenção do alfabeto Hangul, para relembrar a todos os habitantes e visitantes a importância cultural de uma educação igualitária.

No dia 9 de outubro também é comum ver exibições artísticas de profissionais em caligrafia, em que eles se reúnem e escrevem palavras de apoio e celebração em frente ao museu do Hangul. Algumas localidades realizam competições de escrita e demonstrações do uso das ferramentas. Para demonstrar o apreço pela própria cultura, diversos Centros Culturais sediam apresentações de dança e música tradicional. Afinal, o Dia do Hangul é perfeito para demonstrar interesse e orgulho por toda e qualquer forma de expressão artística popular.

Texto feito em parceria com o Centro Cultural Coreano no Brasil
Fontes: (1), (2), (3), (4), (5), (6), (7), (8), (9)
Imagens: The Transformation of Kansong Exhibition e 대한민국 구석구석
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  • Bárbara Contiero

    Maria-cafeína. Tenho mais livros do que amigos. Minhas roupas são 70% de brechós. Epik High me mantém acordada de manhã.

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