A conquista da liberdade é uma forma de renovar e promover a esperança à toda uma nação. A trajetória até ela requer luta, insistência e união, logo, o momento do triunfo precisa ser celebrado e relembrado. No caso da Coreia do Sul, o momento da independência é celebrado anualmente em 15 de agosto, com o feriado nomeado Gwangbokjeol (광복절). Também conhecido como Dia da Liberação Coreana, relembra a emancipação do império japonês, que havia anexado a península como colônia em 1910. A data traz à tona o momento de soberania coreana e, apesar de ter dado início à separação das Coreias, é o único feriado celebrado por ambos os países.
Antes de assumir a atual formação com os extremos norte e sul divididos em duas nações, a Coreia era o reino unificado de Joseon, uma dinastia longa que durou de 1392 a 1910, quando os japoneses usaram a força militar e acordos políticos com os EUA para anexar oficialmente o território ao império nipônico. Na época, diversos países, assim como o Japão, estavam passando pelo auge da Segunda Revolução Industrial e precisavam de terrenos férteis para continuarem a produção de alimentos sem afetar a fabricação de armamentos. A península coreana era um país predominantemente rural, com extensas produções de arroz e, por ser rodeado por água, um valioso espaço portuário.
O período de colonização e controle militar japonês durou até 1945. Nesse intervalo a população coreana sofreu com a censura de suas demonstrações culturais. O império japonês fez tentativas de apagar o idioma coreano, proibindo que fosse usado em público e ensinando a própria língua nas escolas. Os documentos datados da ocupação colocavam as medidas como filantrópicas, ou “tentativas de civilizar” os habitantes. A produção agrícola era confiscada para alimentar os japoneses, assim causando um período de escassez na Coreia e revoltas não apenas no território, mas também em embaixadas coreanas ao redor do mundo.
O tratamento desumano e apagamento dos traços culturais não eram aceitos cegamente pelos coreanos. Desde 1910 até a liberação, houveram protestos e a criação de movimentos em prol da independência. Uma das principais movimentações políticas foi a passeata pacífica em 1º de março de 1919, conhecido como Dia do Movimento pela Independência Coreana. O primeiro, dos 1500 protestos seguintes, levou às ruas mais de 2 milhões de coreanos empunhando bandeiras e entoando o hino nacional, demonstrando orgulho e resistência. Como resposta, foram atacados por militares de uma forma atroz. Aquela foi a fagulha da esperança e da luta.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o interesse japonês em continuar expandindo o império obrigava soldados coreanos a lutarem nas trincheiras. As mulheres coreanas tiveram um destino até hoje considerado uma das fissuras pós-guerra na relação entre a Coreia do Sul e o Japão: eles convocavam mulheres e meninas menores de idade para servirem aos soldados como “Mulheres de Conforto”, sofrendo abusos e agressões diárias. A culpa da nação nipônica pela escravidão sexual é, até os dias atuais, um tópico de intensa discussão. Apesar dos protestos anuais em defesa das sobreviventes e pedidos por medidas de proteção e auxílio, essa dívida histórica ainda não foi assumida pelo governo japonês.
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A Coreia sentiu o sopro de liberdade chegar até à península entre julho e agosto de 1945. Durante a Conferência de Potsdam, os líderes políticos Josef Stalin, da União Soviética, e Harry Truman, dos Estados Unidos, concordaram em ocupar e libertar o território, assim dividindo-a temporariamente entre norte e sul. Ao fim, o império japonês estava enfraquecido e as sanções colocadas os obrigavam a liberar oficialmente todos os territórios anexados.
As Coreias foram divididas no mesmo ano, separadas pelo Paralelo 38 (uma linha imaginária, 38 graus ao norte da Linha do Equador). Quando a União Soviética e os EUA receberam o aval para invadir e libertar o território, aceitaram uma cláusula tornando a ocupação de seus respectivos exércitos temporária. Em 1948, sem nenhum acordo assegurando a unificação das Coreias, o pleito eleitoral acabou sendo aberto. A República da Coreia elegeu Syngman Rhee, uma das personalidades políticas emblemáticas durante os movimentos pela independência. Ele se tornou o primeiro presidente do Governo Provisório da República Coreia, criado em 1919 em resposta aos protestos, tendo base em Xangai. A República Popular Democrática da Coreia elegeu o soldado e guerrilheiro Kim Il-Sung como Primeiro Ministro e, posteriormente, presidente.
A liberação coreana é um feriado de suma importância para ambas as nações. Na Coreia do Sul recebeu o título de “Gwanbokjeol” (광복절), em tradução literal significa “restauração da luz do dia”. Enquanto na Coreia do Norte, a data recebe o título de Chogukhaebangeul-nal (조국해방의 날), traduzido como “dia da libertação da pátria”. Apesar da diferença na nomenclatura, a importância é paralela e idêntica: a liberdade plena de existir como um país, depois de 35 anos tendo a identidade nacional confiscada e a cultura reprimida.
O Dia da Libertação Coreana é celebrado demonstrando o patriotismo trazido por essa dádiva. A frente de casas e prédios oficiais são ornadas com bandeiras nacionais (Taegukgi). Uma cerimônia oficial em memória de todos os ativistas e mártires da independência é feita, assim como apresentações culturais. O presidente em exercício visita o Salão da Independência da Coreia, em Cheonan, ou o Centro Sejong de Artes Performáticas, para a apresentação da “Gwangbokjeol norae” (광복절 노래), a música oficial escrita pelo historiador Jeong Inbo e pelo musicista Yun Yongha. A canção celebra e demonstra o orgulho nacional pela independência.
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Texto feito em parceria com o Centro Cultural Coreano no Brasil
Fontes: (1), (2), (3), (4), (5)
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