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Bullying na Coreia do Sul: A realidade por trás do K-drama “A Lição”

[AVISO DE GATILHO] O conteúdo a seguir lida com temas sensíveis que podem servir de gatilho. Recomendamos cautela ao prosseguir a leitura.

Um dos problemas que vem ganhando destaque e visibilidade na Coreia do Sul é o bullying, principalmente em ambiente escolar. Nos últimos 20 anos, as denúncias de abuso físico e psicológico em instituições de ensino vem crescendo, explicitando uma realidade dolorosa para as diversas vítimas que carregam os traumas e memórias.

Além das denúncias feitas contra personalidades públicas (como idols de k-pop, atores, atletas e até mesmo políticos), casos de bullying no cotidiano também passam a receber mais atenção, principalmente com números tão expressivos de reclamações e imputações às instituições de ensino e delegacias locais.

Tendo a discussão viva diante dessa “epidemia nacional de bullying escolar”, a dramaturgia passa retratar com maior fidelidade determinados casos graves. No fim de 2022, estreou na Netflix o K-Drama A Lição (The Glory), cuja trama gira em torno dos traumas e violência sofrida pela protagonista durante o Ensino Médio, após desistir dos sonhos e da própria vida acadêmica, Moon Dong Eun (Song Hye Kyo) procura vingança contra os bullies.

O K-Drama foi duramente criticado em fóruns coreanos por suas cenas de violência explícita. Contudo, a fidelidade demonstra a seriedade do assunto, principalmente nos momentos mais sérios. Alguns dos casos representados na tela foram inspirados por situações reais, denunciadas às autoridades coreanas ao longo dos anos.

Bullying escolar: Feridas, por vezes, não tão invisíveis

A vida social de um indivíduo começa, principalmente, na escola. A interação e a forma como ele irá encarar a sociedade, se entender como indivíduo em relação aos outros, tudo isso recebe influência direta da experiência em ambiente estudantil. Contudo, nem sempre um estudante passa os anos de educação básica convivendo de forma saudável.

O bullying em ambiente escolar na Coreia do Sul é um problema de grande dimensão. Desde a década de 1990 – quando os dados relacionados às agressões entre estudantes passaram a ser analisados com maior seriedade, devido a uma série de suicídios cometidos por jovens após experienciar agressões -, concluiu-se que violência verbal, física ou sexual são comuns e crescem em porcentagem conforme as décadas passam. Esse fenômeno passou a ser chamado de “wang-ta”, termo cunhado pelo pesquisador Hyojin Koo em estudos realizados sobre a natureza do bullying em instituições coreanas, no ano de 2005.

O termo wang-ta, na verdade, descreve comportamentos que remetem ao bullying, logo micro agressões se configuram como wang-ta, tanto quanto ações que ameaçam a vida da vítima.

Com estudos sendo feitos sobre o bullying em escolas de Ensino Fundamental e Médio (entre 7 e 18 anos), foi aprovado em 2004 a Lei de Prevenção da Violência Escolar e Atos de Contramedidas, a qual pune em 9 diferentes níveis os agressores:

  • Nível 1: o mais leniente, para casos de menor gravidade, no qual o agressor pode somente escrever uma carta se desculpando formalmente com a vítima.
  • Nível 2: o perpetrador da violência é afastado de quem está sendo agredido.
  • Nível 3: exige o cumprimento de serviços, como limpeza da escola, entre outros.
  • Nível 4: a partir daqui, a justiça pode ser acionada. Sendo assim, o agressor deve servir uma quantidade estabelecida de horas para serviço comunitário.
  • Nível 5: requer educação especial e tratamento psicológico ao agressor.
  • Nível 6: resulta na suspensão temporária do estudante.
  • Nível 7: a presença do perpetrador da violência é completamente vetada do ambiente.
  • Nível 8: o segundo mais sério, estabelece que o agressor deverá ser transferido de escola.
  • Nível 9 define a expulsão completa do indivíduo da instituição de ensino.

Entre 2004 e 2012, os números relacionados ao “bullying tradicional” passaram a diminuir, no entanto, diferentes formas de ameaçar e agredir colegas de classe acabaram surgindo. Um exemplo é o cyberbullying, do qual ganhou forças conforme as redes sociais e smartphones passaram a ser parte integral do cotidiano.

Dados levantados pelo Ministério da Educação para comparação, demonstram que em 2013 houve a denúncia de 11.749 casos de bullying em escolas. Os números de 2019 mais do que dobraram, subindo para 31.130 acusações formais.

As denúncias costumam ser feitas de forma anônima, preservando a identidade da vítima, afetando negativamente somente a imagem do agressor. Contudo, alguns casos de maior gravidade acabam ganhando grandes repercussões.

A Lição: Ficção inspirada em denúncias reais

Como foi mencionado no início do texto, a proporção do problema envolvendo bullying na Coreia do Sul tornou-se um tema discutido em K-Dramas e filmes, como o recente lançamento da Netflix, A Lição (The Glory).

A novela coreana de suspense, em 16 episódios, conta a história de Moon Dong Eun (Song Hye Kyo). Após anos sofrendo com a perseguição e violência física na escola, levando à sua desistência da vida acadêmica, a protagonista elabora um intrincado plano de vingança contra seus agressores.

Durante a primeira parte liberada pela Netflix, uma cena chocou e gerou críticas (e elogios) dos espectadores, devido a forma crua como a violência foi exibida: o momento em que Park Yeon Jin (Lim Ji Yeon) queima Moon usando um modelador de cachos.

Essa cena foi inspirada num caso real de bullying registrado em 2006, numa escola em Cheongju, do qual ficou conhecido como “Caso de Bullying com Modelador de Cachos”.

Na época, uma estudante de 15 anos foi presa após queimar mais de uma vez o braço de outra aluna 1 ano mais nova, após passar cerca de 20 dias agredindo psicológica e fisicamente com tacos de beisebol, chutes, socos, arranhando-a com um alfinete e roubando o dinheiro do almoço (além das consecutivas ofensas). Como a idade para julgamento na Coreia do Sul é a partir dos 14 anos, a agressora foi levada para a delegacia, mas a punição oficial não foi divulgada.

O caso chocou e informações pessoais da agressora foram vazadas, gerando ameaças à família. Os administradores e inspetores escolares também sofreram punições por negligência, ao não impedirem que atos violentos fossem cometidos em âmbito escolar.

Esse crime cometido em Cheongju teve um desfecho envolvendo a justiça, mas dados e relatos de vítimas indicam que nem sempre a escola penaliza propriamente os perpetradores de violência. Em A Lição, Park Yeon Jin e os outros agressores não sofreram grandes punições pelos crimes.

A impunidade de agressores e daqueles que são coniventes com a violência é um dos temas centrais em A Lição, assim como os traumas gerados à vítima pelo bullying e abusos.

Infelizmente, estudiosos indicam que o bullying dificilmente deixará de existir no futuro, mas a discussão dos reflexos da violência a longo prazo é uma ferramenta de grande importância para a conscientização, o primeiro passo para mudanças duradouras.

A história A Lição está disponível no catálogo da Netflix. A segunda parte estreou nesta sexta (10).

Fonte: (1), (2), (3), (4), (5), (6), (7), (8), (9), (10)
Imagem: Netflix
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  • Bárbara Contiero

    Maria-cafeína. Tenho mais livros do que amigos. Minhas roupas são 70% de brechós. Epik High me mantém acordada de manhã.

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